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Amorosamente

Meros pensamentos dramatizados em verso e em prosa

Amorosamente

Meros pensamentos dramatizados em verso e em prosa

Dom | 20.08.17

A tempestade que te substituiu.

H. Alegria

Tu abandonaste-me. Arrumaste as tuas coisas na tua mala e ainda bateste com a porta, para que eu pudesse ter perfeita noção do que estavas a fazer. Tornaste bem claro que nada te faria mudar de ideias. Tornaste bem claro o quão farta estavas e como a outra era melhor que eu. E eu fiquei impávida e serena, adotei essa postura e assim permaneci. Achei que era melhor assim. Depois de tantas palavras mal-encaradas que trocamos enquanto tudo ardia à nossa volta, achei que nada havia a fazer. Deixei-me dominar pela mágoa que fizeste nascer dentro de mim. Mágoa intensa e profunda, há que admitir. Foram precisas longas horas para acordar para a tempestade que estava a bater à minha porta. Um tornado que te viria substituir. Rapidamente o desencadeei, e já não pude fugir.

Depois de meses a fio neste turbilhão, que todos os dias fere um pouco mais fundo na minha alma, permaneço sentada na mesma cadeira, a mesma cadeira onde outrora estava “impávida e serena”, mas agora cada lágrima que desce o meu rosto multiplica-se por três.

Vivemos na era moderna, onde todos sabem tudo sobre nós, sem nada realmente saber. E assim nasceu o meu vício, de te ter por perto sem sequer te ter. Desta forma é criado um fantasma, que me persegue de noite e de dia. Vagueia por esta casa, ao mesmo tempo que permaneço sentada, no meio desta ventania. Os meus longos cabelos esvoaçam e quase se soltam de mim, mas isso não me incomoda, incomoda-me a felicidade que hoje só pertence a ti.

Sab | 12.08.17

Vinte e dois meses.

H. Alegria

Neste momento em que escrevo faltam seis dias para o teu aniversário. Mas não estarás cá para o celebrar. Seriam 87 anos, 87 anos de alegrias e batalhas vencidas, se não fosse a última que te levou de nós. No entanto este texto vem à vista de todos no dia que faz um ano e dez meses que nos deixaste… E todos pensarão que falo do meu avô, afinal ainda sou uma garotinha, a garotinha que tu disseste já não precisar de ti, mas pai, como tu te enganaste! Fazes-me falta a cada suspiro, fazes-me falta a cada segundo, a cada tropeço, a cada pequena vitória. Vitórias essas que jamais serão tão vitoriosas como outrora foram, porque hoje não as posso celebrar contigo do meu lado. As palavras lutam na minha mente, todas elas se dirigem a ti, todas elas querem ir para o teu lado, pois sabem o homem especial que eras. Eras, és, e sempre serás. É assim que te guardo no coração. Mas sabes que nem tudo é perfeito, e só te posso dizer o quanto eu receio! Receio esquecer-me do teu cheiro, da tua voz, do teu rosto, do teu colo… Só tu tinhas o dom de me acalmar, nos momentos de maior sofrimento vinhas devagarinho e olhavas para mim com aquela cara de desgosto, aquele olhar de “como posso eu ser tão incapaz de parar o sofrimento da minha pequena”, e só de pensar sinto as facas abrirem-me o coração. As lágrimas percorrem a minha face incessantemente, formam oceanos por ti, para mostrar a tua grandeza e força, para mostrarem que jamais serás esquecido por completo. Dói-me o peito, mas quando me falam de ti, sejam memórias mais antigas ou do fim, esboço um sorriso, um sorriso sincero, um sorriso que mostra o quanto me orgulho da marca que deixaste em cada pessoa cuja vida frequentaste. Mas admito, nunca me orgulharei tanto como da marca que deixaste em mim, a marca de pai confundido por avô, a marca de dedicação e de amor. E no meio de tanta lágrima sorrio, tal e qual como naqueles dias escuros, pois as boas memórias permanecem e ressurgem mesmo no meio de tanta dor e sofrimento. As boas memórias mantêm-se no meu peito, mas o simples facto de seres tu que lá está torna qualquer memória numa bonita… E num suspiro por entre soluços de lágrimas que jamais param, espero que onde quer que estejas te lembres de mim, e te lembres to quanto eu te adorarei para sempre!

Qua | 02.08.17

Adeus, melhor metade de mim.

H. Alegria

Procuro uma música que me acolha. Uma música que me acolha nos teus braços. Algo que me diga tudo aquilo que eu queria dizer, e algo que me ajude a tudo o resto entender. Tudo isto enquanto me recebes de volta, com um abraço apertado. Tu seguiste em frente rapidamente, afinal é disso que se trata quando te substituem, trata-se de rapidez… Mas eu continuo aqui parada, à espera que olhes para trás e te arrependas. Não quero que te arrependas do que fizeste até hoje, quero que te arrependas de não me teres trazido nessa jornada contigo. Quero que te arrependas por teres desistido de mim e da minha história, de mim e dos meus problemas. Na prateleira, onde guardo o livro da tua passagem pela minha vida, mantenho-o aberto para que não acabe. Quero outro capítulo, não sinto que isto tenha sido suficiente. Afinal jamais eu imaginaria o estrago que uma discussão poderia fazer… Mas a culpa não é de nenhuma das partes, cada parte teve o seu contexto, aquilo por que estava rodeada, cada parte teve algo que levou ambas ao precipício que levou. E ainda assim, eu só queria que me desses uma oportunidade, de me explicar e de te ouvir. Ambos os lados têm culpa, mas ambos os lados estão livres dela. E é nesta complexidade que eu me perco, por entre tragédias e baladas… Queria que percebesses que estou de braços abertos para chegarmos a um acordo, um acordo feito de cabeça limpa, um acordo sem cabeças quentes. Foi isso que nos destruiu, a panela de pressão onde a água já fervia. Preocupámo-nos mais com os conflitos e o nosso próprio egoísmo do que qualquer outra coisa. Preocupámo-nos com o que nos convinha. Eu perdi a melhor metade de mim… Mas agora venho tarde e a porta está fechada, a casa está vazia e só posso deixar um recado escrito. Quando o vires também será tarde pois eu própria também já terei partido.